Arquivo

Arquivo do Autor

Rosas do Ceará

Falar em rosas hoje parece coisa do Dia dos Namorados, né? Mas a história que eu vou contar é outra. Acordei cedo hoje e, ao tomar café, liguei a televisão para distrair a cabeça. Estava passando o programa Globo Rural, que quase nunca assisto. Já ia mudar o canal quando vi que o tema da matéria eram rosas (e eu adoro flores!). Resolvi deixar e ver o resto. O jornalista contava a história do cultivo de rosas no estado do Ceará –  que possui algumas áreas de região serrana.  Com o apoio de japoneses, europeus (holandeses) e colombianos foi desenvolvida toda uma tecnologia de cultivo de rosas adaptada à região, que passou a produzir flores de valor comercial para nosso mercado interno e para exportação. Hoje inclusive existem rosas cearenses sendo vendidas em Amsterdam. Curiosamente, no início do cultivo, houve preconceito em relação à mão de obra para esta atividade. Diziam os locais que mexer com flor era coisa de mulher e de baitôla (bicha). Outros plantadores de rosas foram questionados por pessoas simples do local, dizendo que eles deveriam plantar feijão, pois o povo de lá não comia flor – raciocínio plenamente justificável numa terra onde a subsistência imediata é literalmente questão de vida.

Agora vou começar a contar a história de fato – a da dona Maria, que vive na Serra do Ibiapaba, nessa região do Ceará onde chegaram as flores. Mulher simples, mãe de quatro filhos, abandonada pelo marido e morando num barraco de madeira prestes a cair em cima de suas crianças famintas e sem futuro algum. Naquela situação limite de vida, o filho mais velho, de doze anos, foi à “fábrica” de rosas do local pedir um emprego para a mãe (por iniciativa própria). O gerente, sensibilizado, empregou a Maria. Lá ela foi treinada e passou a ser uma cultivadora de rosas. A técnica em segurança do trabalho da empresa foi um dia na casa da Maria fazer uma visita e viu as condições precárias da moradia. Em tese, como técnica do trabalho, nada daquilo era da conta dela. Mas tem horas em que o ser humano fala mais alto e ela resolveu ajudar. Convenceu o dono da fábrica a construir uma nova casa para a Maria, e num curto período de tempo, Maria morava numa casa de alvenaria muito mais confortável e segura.  Os filhos agora apareciam comendo à mesa, sorriso no rosto, e Maria uma mãe feliz. Quando me dei conta, estava com várias lágrimas correndo pelo rosto. Fiquei muito tocado por esta linda história misturando rosas, fome, iniciativa, coragem e solidariedade.

As rosas do Ceará viraram feijão na mesa sim. O altruísmo de quem foi além da sua obrigação profissional mudou as condições de vida de toda uma família. Um menino destemido e um empresário sensível reescreveram uma história. E eu me senti muito orgulhoso ( e chorando agora de novo à medida em que escrevo) pelo tanto que pode fazer o ser humano quando enxerga com o coração. Seria comum apontar o dedo a esta mulher e dizer que ela foi irresponsável, não deveria ter engravidado, etc, etc…. Todavia, existe gente que consegue ver além e restaurar a dignidade dos outros. Devo estar mais sensível hoje, mas as lágrimas que ainda caem são de felicidade por esse Brasil bom que está em nossa raiz e que passa muito longe da banda podre dessa classe política desgraçada que só sabe acumular milhões inexplicáveis.

Categorias:Uncategorized

O Brasil comprou uma briga desnecessária

Césare Battisti. Um cidadão italiano que se envolveu numa série de ações em seu país, resultando na morte de algumas pessoas (homicídos). Foi julgado e condenado em seu país natal. Esta decisão passou por apelações em três instâncias na Itália, tendo sido mantida em todas. Battisti fugiu para a França,  foi acolhido pelo governo Mitterand e por lá ficou foragido uns tempos. Com a mudança de governo na França, decidiu-se por nova análise do caso, que tramitou nas cortes francesas.  Frente à iminente decisão da Corte Francesa pela extradição, Battisti fugiu do país e veio para o Brasil, ingrssando aqui com passaporte falso. (Até aqui todo mundo se pergunta o “kiko” tenho com isso como brasileiro…)

No Brasil, o Supremo julgou o caso e autorizou o Presidente Lula a proceder à extradição. Em outras palavras, o pedido italiano era legítimo e o STF remeteu o processo ao executivo, a quem DE FATO cabe a decisão constitucional da devolução do cidadão. Lula resolveu negar a extradição. Foi nesse momento que se configurou a negativa do Estado Brasileiro à extradição, e não ontem no STF. O que deliberou ontem nossa Corte foi a soltura de Battisti no Brasil, já que o mesmo se encontrava preso em regime fechado há quatro anos (e não o mérito da validação da decisão presidencial).

Fundamentou a AGU para Lula, na ocasião, que Battisti “poderia sofrer maus tratos no cárcere italiano”. Vejam que argumento risível. O Brasil não tem o direito de julgar a evolução da democracia no Estado Italiano. E de, indiretamente, inferir que a Itália é um país que tortura os seus presos. Ontem o Ministro Peluzo, presidente do STF, disse que o Governo Brasileiro apresentou argumentos de defesa fictícios para justificar as razões de sua negativa. Não havia fatos concretos de que, por exemplo, haja tortura sistemática de presos no país de origem de Battisti. O que o Governo Brasileiro fez, em nome da proteção dos direitos humanos de um fugitivo (essa palavra mesmo, não confundir por favor com refugiado…), foi invadir a soberania de uma outra nação, muito mais antiga que a nossa. E ainda foi lembrado em plenário pela ministra Ellen Gracie que até mesmo a Corte Européia de Direitos Humanos já havia endossado a validade e lisura da decisão do judiciário italiano.

Agora, haverá recurso à Corte Internacional de Haia (com grande possibilidade de derrota para a decisão de Lula). Qual a necessidade de tal queda de braço com uma nação democrática como a Itália? Ficamos mais democráticos perante o mundo? Não, pelo contrário. Será que somos assim tão guardiães dos Direitos Humanos, vendo-se o estado em que se amontoam os nossos presos e  de como são tratadas muitas de nossas minorias  –  todos brasileiros de nascimento ?  Não novamente.  E hoje declarou o Governo Italiano: “”A libertação de Battisti demonstra como, no Brasil, a dependência entre o sistema judiciário e a política limita fortemente os padrões democráticos deste país emergente”. Tudo isto foi muito ruim para o Brasil. E de nada ajudou nossa nação, a exemplo da desastrosa relação com o governo do Irã. Temos cometidos muitos deslizes na área internacional – e cada vez ficamos “pior na fita”.

 

Categorias:Uncategorized

Pense onde vc está antes de agir…

A mídia está todos os dias dando repercussão ao desatino dos bombeiros no estado do Rio de Janeiro. O que me incomoda nestes casos é que parece vivermos num mundo sem regras, onde, de repente, alguém se sente autorizado a chutar o balde e atropelar a lei. Bombeiros são militares e possuem códigos de conduta e disciplina diferentes dos das outras ocupações. Até mesmo o sistema judiciário militar é distinto, inclusive com um Superior Tribunal Militar para analisar os agravos à lei tão específica desta categoria. Ao ingressar no serviço militar, todas as pessoas são informadas das pesadas normas adicionais de comportamento pessoal e profissional que sobre elas começarão a vigir. Talvez vcs se lembrem de quando assumiram algum emprego e foi-lhes mostrado o que seria ou não permitido dentro da nova empresa. Todos nós somos submetidos a regras institucionais.

Militar não pode (e  nunca pode) fazer greve. Se está certo ou errado, não sei.  Mas todos eles foram informados sobre esta regra. De repente, um grupo de desatinados resolve invadir um quartel, promovendo um motim (quebra grave da ordem militar) e a população aplaude!!! Por mais compreensíveis que sejam as razões (salário ruim, condições de trabalho, etc.), nada justifica o desfecho de baderna e tumulto da ordem pública. Nem a lei de greve (aplicável aos civis e suas reinvindicações) permite depredação de bem público, seja qual for a categoria.. O que esperamos dos militares é que cuidem da ordem pública conforme a lei – e não apesar da lei…

A atitude do Governador Sérgio Cabral está correta. O ato dos bombeiros foi crime para quem é militar. E a população mistura alhos com bugalhos, pedindo para soltar os “heróis bombeiros”. O trabalho deles é heróico sim –  pois salvar vidas o é. Mas o que vi na TV nada tem de heroísmo ou bravura. Anarquia não pode servir de escudo para insatisfações com o estado das coisas. Precisamos de pensar nas consequências de nossos atos antes de os praticarmos – o mundo não é só nosso e não podemos tolerar que boas razões sirvam para atestar má conduta. E quem brinca com fogo pode ser queimar mesmo.

Categorias:Uncategorized

Evangélicos e católicos sabem ser políticos

Hoje em Brasília a “marcha dos cristãos” contra a aprovação do projeto de lei pela criminalização da homofobia reuniu oito vezes mais pessoas nas ruas da Capital Federal. Na sequência, os líderes religiosos encarregados da promoção do movimento entregaram ao presidente do Senado,  José Sarney, um abaixo assinado com mais de um milhão de assinaturas também contra a aprovação do mesmo projeto. Algumas simples lições aprendidas:

1. Vivemos numa democracia onde a manifestação do contraditório é constitucional (gostemos ou não).

2. A manifestação dos “contras” foi bem mais numerosa do que a dos “favoráveis”. Embora aqui tamanho não seja documento, fica patente a capacidade de mobilização melhor do que a nossa (e eles não lutavam ativamente a  favor de nenhum direito, apenas contra o direito alheio). As lideranças de lá foram mais convincentes em agregar adeptos e montar uma passeata em plena Capital Federal.

3. Eles foram capazes de reunir mais de um milhão de assinaturas contra o PLC 122/2006. Não me lembro de abaixo-assinado desta envergadura promovido pela comunidade gay a favor deste projeto até agora. E aqui, sim, tamanho é documento.

4. Muitos podem dizer: “Temos a maior parada gay do mundo, que bota mais de 3 milhões de pessoas na rua”. Não quero desqualificar este importante trabalho da APOGLBT-SP e nem o dos militantes que ali estão dando um duro danado. Entretanto, parece-me pertinente colocar, como frequentador de várias edições da Parada até hoje, que boa parte da multidão que ali está o faz pelos mais variados motivos. Muitos vão pela festa dos trios e suas músicas, e pela alegria em observar a originalidade do nosso jeito de ser. Ou seja, o motivo é se divertir e não manifestar adesão de fato a uma causa justa. Para esses muitos, ocorre um carnaval fora de época.

5.  “Não ser contra” não significa “ser a favor”.  Muitos batem palmas e assoviam enquanto protegidos no anonimato das multidões e redutos gays, mas entram numa espécie de hibernação ao retornar a suas cidades e vidas pessoais. Essas vozes não são ouvidas porque não falam. Motivos há muitos (desculpas também), mas o resultado final é o atropelamento por quem resolve gritar mais alto e em desfavor de toda a racionalidade e cidadania da chamada minoria. Alguns ministros do STF expressaram este pensamento em seus votos na decisão sobre as uniões estáveis.

5. Tenho vários amigos gays e conheço outras pessoas para quem a “Parada Gay” significa tão somente um motivo para novas festas mirabolantes na The Week e seus DJs dos quatro cantos do mundo.  Estas festas ficam lotadas (não importa o preço das entradas) e as pessoas nem mesmo aparecem na avenida Paulista no domingo. Quem é gay e poderia estar lutando pela própria causa muitas vezes dorme enquanto o bloco está na rua. Que bom seria se fossem nas festas mas também apoiassem o movimento de rua (com o mesmo pique da balada…).

Posso ser apedrejado pelo que disse acima, mas não importa. O resumo de tudo é que as ações de afirmação precisam ter muito mais densidade política do que mostraram até agora.  Nossa voz ainda não tem a representatividade devida no Parlamento. Os gays brasileiros têm-se mostrado muito tímidos ao eleger seus representantes nas câmaras e assembléias legislativas. Estou seguro de que dez ou vinte Jeans Wyllys fariam muito mais barulho e pressão que apenas um (e seus bravos aliados).  A maioria daqueles que formulam e aprovam as nossas leis fala uma linguagem diferente  e não costuma ser muito sensibilizada por idealismo e justiça das causas. A moeda corrente é o voto e a pressão, tanto por parte do Executivo, quanto das bases de apoio.

Hoje foi reafirmado pelos evangélicos que política é um processo que se constrói elegendo representantes e botando a cara na rua. De menor importância é a justiça da causa (pelo menos para o atual parlamento). O que conta de fato é a aglutinação de votos e a pressão que dela decorre.  Sabemos que muitos desses votos cristãos são conseguidos de formas as mais questionáveis possíveis. Todavia, valem tanto quanto o meu e o seu. Temos toda a razão em reinvindicar tratamento igual de cidadania. O STF foi unânime ao apoiar este princípio. No nosso Congresso, infelizmente, intenção não bota mesa e o buraco é muito mais embaixo.

Categorias:Uncategorized

A Bíblia – o que é? (Post republicado a pedidos)

Algumas simples considerações:

1. O nome vem do grego: “Biblion” significa livro (singular) e “Biblia” conjunto de livros (plural)

2. Como um conjunto de livros, foi escrito por um conjunto de pessoas em sequência cronológica de várias centenas de anos. Portanto, suas afirmações e relatos precisam ser vistos à luz de cada realidade que os geraram.

3. Esses livros foram escritos em idiomas diversos, arcaicos, e todos foram posteriormente traduzidos ao latim e às línguas modernas. Quem já fez tradução sabe que o conteúdo traduzido sempre traz algo do tradutor em si, por mais isento que se queira ser. Isso porque entendemos a vida através do nosso olhar. Tradução feita sem interpretação, de forma mecânica, pode-se obter pelo Google Translator. Façam uma experiência e vejam no que vai dar. Em resumo: os textos bíblicos têm influência involuntária do olhar de quem os traduziu e prováveis influências ideológicas intencionais “plantadas” pela Santa Igreja.

4. A Bíblia é uma compilação de natureza moral. Traz histórias, relatos e mandamentos sobre o padrão de vida e princípios preconizados para o cristianismo. Outras religiões utilizam textos diversos, como os “Vedas” do hinduísmo, o “Mahabharata” do bramanismo, o “Alcorão” do islamismo e por aí vai… Todos falam de Deus. E devem ser entendidos como uma opção individual de crença e relação com um ente supremo. A maioria cristã não pode subjugar demais minorias segundo as suas crenças. Isto é vedado num Estado Democrático de Direito.

5. A Bíblia não é a Constituição de nosso país. Vários de seus princípios foram incorporados em nossa Carta Magna e convertidos em lei (não matarás, não dirás falso testemunho, etc…), mas não a sua totalidade e muito menos a sua interpretação literal. Não interessa mais se a Biblía diz que família só pode começar pelo casamento. Nossa Constituição já consagrou outros tipos de configuração familiar, e a Igreja pode espernear à vontade. Nosso país é plural. Eu creio em Deus, mas não votei nele para presidente nem deputado constituinte. E nosso direito é constitucional, não bíblico. Imaginem uma sentença judicial: “Condeno o réu a 15 anos de reclusão com base nos textos de Mateus 2:1-8, Isaías 14: 7-10 e I Coríntios 8: 3-6”. Parece ridículo, mas isso é exatamente conferir lastro legal a um texto de natureza religiosa e pessoal.

6. Quando questionado pelos fariseus judeus sobre a legalidade de se pagar tributos a Roma, Cristo respondeu: “Daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Essa emblemática afirmação mostra que religião e política não se misturam. Direitos e deveres civis devem ser tratados à parte de obrigações religiosas, cada qual na sua esfera.

7. A Bíblia não é profissão de fé de vários brasileiros. Opção deles, protegida pela lei. Isso não os torna menos brasileiros ou menos capazes perante a lei, em todos os seus aspectos.

8. A Bíblia serve de base teológica para inúmeras igrejas ditas cristãs, mas as práticas dessas igrejas varia enormemente entre si. Exemplo: uma delas batiza crianças jogando água na cabeça; outra afunda toda o corpo da pessoa na água e só o faz após uma certa idade, fora da primeira infância. Não é só diferença de forma, é diferença de conceito e interpretação. E isso usando o mesmo texto base. Citei este exemplo, mas há vários outros, alguns bizarros (não poder cortar cabelo, assistir TV, comer carne de porco, etc…).

9. A Bíblia pode e deve regular os princípios da Igreja. A liberdade religiosa é assegurada pela nossa Constituição, e que façam bom uso dela. Mas limite-se cada Igreja a ditar normas para quem voluntariamente desejar ser seu seguidor. Não tenho a menor vontade de me casar numa Igreja e nem espero que a Igreja tenha que acolher qualquer casamento fora de seus princípios. Mas é indigno fazer lobby no Regresso Nacional e tentar impor esse princípio a quem dele não compartilha. Que as leis da Igreja governem apenas a Igreja e não o Estado.

Fico por aqui, por enquanto. Sou brasileiro e desejo estar sujeito a normas legais e constitucionais que respeitem a diversidade da sociedade, as minorias e os direitos fundamentais do ser humano. Passou disso, que cada galo vá cantar no seu puleiro.

 

Categorias:Uncategorized

O que você procura ??

Aproxima-se o dia dos namorados e, junto com ele, um certo pânico na cabeça de muitos que estão descompromissados. Estar só pode ser uma opção. Algumas pessoas funcionam bem cuidando sozinhas de suas próprias vidas. Elas desafiam a máxima de que “é impossível ser feliz sozinho”. Outras pessoas, porém, estão solteiras contra sua vontade – e para elas vai o blog de hoje: O que vc procura?

O ser humano é algo muito complexo. Um corpo físico que abriga uma mente e uma série de conceitos e experiências vivenciadas desde o nascimento. Cada um vem de um contexto que o moldou e forjou para a vida adulta. Some-se a isso o fato dessa “base do ser” ainda estar sujeita a constantes transformações futuras em virtude das modelagens realizadas pelas alegrias e frustrações de cada dia.

As relações são, assim, o encontro de seres em constante mutação. E esse encontro de valores e bagagens acumuladas nunca é fácil. O que procuramos então? Ouvi certa vez que uma boa relação é aquela em que o conjunto constitui um valor maior do que o da soma das partes em separado. Não se trata apenas de ajuntar duas vidas, mas de potencializar o que há de melhor em ambas. Relações muito assimétricas tendem a ser mais difíceis por esse motivo, pois o fiel da balança oscila demais para um dos polos, gerando um fosso que pode ser muito profundo. Por outro lado, as  muito simétricas tendem a dificultar o surgimento do novo, do inesperado – gerando monotonia.

Mas uma coisa é certa. Relação não é operação tapa-buracos. Quem busca no outro a resposta para as suas frustrações tende a naufragar. Um bom companheiro pode ajudar o outro a enxergar suas falhas e fraquezas. Todavia, o ato de mudança e de aperfeiçoamento sempre será do indivíduo. É um ato pessoal, próprio, mesmo estando “junto” de alguém. E ao superarmos a nossa debilidade individual, realizamos esta mágica operação matemática da soma de créditos para os dois. Eu tenho sido exigente ao buscar. Talvez por me achar no direito de agregar à minha vida alguém com um mínimo existencial que me permita realizar uma troca que nos leve a um patamar melhor. Não quero ser pai de ninguém. E também já passei da época de rebocar alguém pela vida.

Eu ando à procura de viver uma interação que nos traga prazer físico, possibilidade de diálogo e crescimento intelectual e a oportunidade de conhecer e descobrir juntos a diversidade da beleza cultural e natural que existe pelo mundo afora. Faz muito tempo que minha vida deixou de ser a eterna repetição do sábado a noite. Alguém por aí está em situação tão difícil quanto a minha? Talvez a gente possa dar certo…

Categorias:Uncategorized

Parem de acabar com o mundo

O mundo não acabou ontem – assim como não acabou na virada do milênio e em outras tantas ocasiões onde o discurso fatalista condenou a Terra. Não sei o que move as pessoas a fabricarem um fim coletivo e dramático. Parece-me um epílogo temperado com histeria coletiva. E por que tanta preocupação com o fim dos tempos? Existe mesmo essa necessidade de criar um momento comum onde todos os elementos naturais se enfurecerão e tratarão de dar cabo à humanidade?  O “lado de lá”, que é uma incógnita para nós, parece não exercer nenhum magnetismo nos que aqui se encontram –  se for mesmo bom, que espere… Estas são algumas questões para as quais não tenho uma resposta aceitável. De tão inverossímil, esse cenário de colapso geral parece-me mesmo coisa de ficção.

Alguns se reportam ao Livro do Apocalipse na Bíblia, o último do Novo Testamento, cuja autoria é atribuída ao apóstolo João.  Tive a curiosidade de ler este livro (assim como leio quase tudo que bate nas minhas mãos) e fica muito clara desde o início a simbologia que ali se encontra registrada. São inúmeras metáforas, perífrases, monstros de muitas cabeças e chifres, pragas, guerras, enfim – um fim de mundo mesmo… Todavia, um texto com tal grau de figuração e simbolismo é quase impossível de ser interpretado sem entendermos o contexto no qual foi escrito e o estilo de seu autor. Será que o apóstolo falava do fim do mundo de Roma (a dominadora do mundo naquela época) e o nascimento de uma “nova terra” (novo governo ou sistema político) onde as pessoas viveriam melhor? Nenhuma certeza é possível, apenas uma ampla gama de análises e conclusões diversas umas das outras.  Somem-se a isso as profecias de Nostradamus, os escritos maias e tantos outros textos apocalípticos. Que mundo confuso, até para acabar!

O que temos de certo mesmo é o fim de cada um de nós. Esse não se encontra escrito ou predito em nenhum texto. E quando falamos de  nosso fim, penso que devamos inverter o foco. O que interessa é a vida e não a morte. Muita gente já está morta em vida. Acorda sendo quem não é e veste-se dos vários personagens a interpretar no dia.  Marido-faz-de-conta, pseudo-socialista, triturador de egos, falso amigo, bom funcionário e por aí vai. Quem vive um personagem vive outra vida que não é a sua. E o irônico é que o relógio do tempo não para e não volta atrás. Cada minuto gasto com a interpretação da vida é retirado do seu saldo total. E então chegamos ao fim do mundo de cada um, onde alguns nunca viveram e outros quase viveram. Meu desejo é apenas viver minha vida. Interagir com  o mundo. Não me interessa o dia em que o mundo ou o meu mundo irá acabar. Seja esse dia bem vindo quando vier, pois faz parte da natureza humana. Até lá, irei viver.

Categorias:Uncategorized

As luzes vermelhas

Nossa existência resume-se ao conjunto de processos vividos ou ignorados  e suas consequências.  O que acontece no dia de hoje tem repercussão sobre o amanhã, e muitos deles de forma cumulativa. Começo por um exemplo biológico chamado infarto do miocárdio. Uma série conhecida de fatores de risco vai contribuindo, com o passar dos anos, para a formação de uma placa de gordura na artéria coronária. Chega uma hora que a artéria fica obstruída e ocorre o dano agudo do infarto (que já se iniciou lentamente no passado…). O infarto não brotou do nada. Um outro exemplo é a obesidade. Ninguém dorme um dia e acorda 20 quilos mais pesado no outro. Os excedentes de energia de nosso corpo vão sendo convertidos em gordura e lentamente armazenados em cada célula. A roupa, que era folgada, passa a ficar justa, depois apertada e então não serve mais. Fica materialmente detectável que algo está acontecendo, um processo que está nos modificando de alguma maneira.

Estes exemplos guardam entre si a similaridade da progressividade e da possibilidade de interrupção do processo que os constrói. Se alguém nota que a calça ficou apertada, mede seu peso na balança e detecta que ganhou cinco quilos de peso – toma conhecimento de um fato. Perante esta constatação, pode tomar uma decisão, e dela dependerá voltar a usar a calça de novo ou precisar comprar outras roupas. E fica muito mais fácil deter o processo próximo da origem do que anos após (ou seja, é mais fácil perder 5 quilos que 30 quilos).

Tudo o que falei até aqui foi para construir o raciocínio. Não quero falar de infarto nem de obesidade, mas sim do sofrimento mental. Todos nós tendemos a valorizar as doenças físicas e negligenciar as de natureza psíquica. Muitos dos nossos sofrimentos mentais são classificados como “bobagem”, “pity”, “coisa passageira” e assim ficam sub-dimensionados. Todavia, também  são cumulativos. Vamos acumulando a desesperança, a rejeição, as frustrações, a infelicidade e uma grande série de conflitos que colocamos de lado e nos recusamos (consciente ou inconscientemente) a abordar. Começam a aparecer sintomas como isolamento, tristeza, insônia, irritabilidade, abuso de álcool e outras substâncias psicoativas… E nós vamos racionalizando, dizendo que é o momento, que não tem importância.  Vem então o dia em que a barragem se rompe, e desintegramos. Se tivéssemos prestado atenção às luzes vermelhas, o processo poderia ter sido interrompido e reorientado. Se.

Recentemente perdi um amigo de trinta e poucos anos, bonito, com uma carreira e toda a possibilidade de uma vida feliz pela frente. Em minha humilde análise, as luzes vermelhas foram se acendendo progressivamente e ele as escondeu. A infelicidade foi se acumulando até tornar-se insuportável. A dor interna foi tanta que superou a vontade de viver, e ele da vida se desfez.

O tempo para mudança é hoje. O resultado será tanto melhor quanto mais precoce o problema for abordado. Precisamos entender que o sofrimento mental é a epidemia deste século e dele não estamos isentos. Dele inclusive derivam muitos outros sofrimentos do corpo biológico, pois somos só um ser. Cuidemos de preservar a nossa felicidade, as relações construtivas e não nos enganemos com uma ilusão de imunidade a estes processos. O pior cego é o que não quer ver.

Categorias:Uncategorized

Parlamentar pra lamentar

Um amigo me enviou um link com um vídeo muito interessante: Nele, produtores do programa de TV CQC colocaram uma moça bonita e bem vestida no hall do Congresso Nacional, com um documento na mão, cujo teor propunha a inclusão de um litro de cachaça na cesta básica de alimentos. A função da moça era angariar assinaturas para a proposta.

Não demorou muito e já havia assinaturas na proposta. Após firmarem sua assinatura, os parlamentares eram seguidos pelos repórteres e questionados sobre o que haviam acabado de assinar. A maioria não sabia, obviamente. Diziam “costumar assinar” aquilo que é proposto pelos colegas. Não fosse o motivo da proposta já ridículo o suficiente, ainda havia outro detalhe:  o nome do deputado proponente era falso, sequer existia. Quando eram informados sobre o teor do que haviam assinado, as reações eram de espanto, raiva e agressão. Um deles mandou a repórter para “aquele lugar”, outro agrediu fisicamente a equipe jornalística, no melhor estilo Requião.

Em resumo: o parlamentar assinava um requerimento absurdo, de um deputado inexistente, e não sabia explicar o porquê. Fora a piada pronta que isso significa, traz-nos tristeza e revolta ver que este tipo de pessoa é quem legisla pelos nossos rumos. Temos um Congresso Nacional lotado de elementos despreparados, fisiológicos, ignorantes e que em nada tratam de interesses dos brasileiros. Salvas as honrosas exceções, estão ali para se fazerem ricos e obter benesses. E o mais triste de tudo é saber que ali estão pelo voto popular.

Nosso país carece de educação. Educação não apenas no aspecto formal (acadêmico), mas de visão de futuro e capacidade de fazer boas escolhas. Pensem nos muitos nomes que vêm a suas cabeças quando analisam a composição de nosso Congresso. Parece um show de horrores, um picadeiro de palhaços, equilibristas e malabaristas. Gente que foi eleita por processos de aliciamento e chantagem psicológica, promessas de benefícios (mesmo que isso signifique um saco de cimento), apadrinhamento de poderosos, enfim, um sem-número de razões equivocadas. E a estas pessoas entregamos a tarefa de legislar os rumos do Brasil.

Fico meio cético sobre o que nos espera adiante. Mesmo no Facebook, costumo ler barbaridades escritas em algum idioma similar ao Português. Gente que estuda e não aprende, lê e não entende. Se esses estão assim, o que será dos outros com educação ainda pior? Juro que estou desanimado. Triste por ser governado por gente tão pobre intelectualmente, quando o que o Brasil precisava era de uma grande massa crítica de parlamentares que tivesse o mínimo de pudor e formação para regulamentar os desvarios desse país.

Torço para que minha visão seja absolutamente equivocada e fatalista. Que eu esteja no meio de um pesadelo ruim, mas com o dia prestes a raiar. Não quero mais saber qual nossa posição entre as dez maiores economias do mundo enquanto nossa educação colocar-se em patamar de países africanos sem recursos, lá pela quinquagésima e tanta posição. Isso tem que mudar um dia. Nesse pesadelo que eu mencionei, dá muita vergonha ser brasileiro.

Categorias:Uncategorized

O rumo das nossas vidas

Hoje participei da Marcha Nacional contra a Homofobia, em Brasília.  Não vou me debruçar sobre questões ideológicas ou de alto grau de elaboração filosófica. Apenas me detenho nesta foto que tirei. Passei por este casal, abrigado com a bandeira da diversidade, que olhava para a sede do Supremo Tribunal Federal. O mesmo tribunal que lhes assegurou o direito de estarem juntos, gozando de prerrogativas e direitos civis. Ali estavam protegidos pela bandeira que os envolvia e pela edificação que os devolveu o status de gente. Parei e fiz  foto de supresa. Eles ainda nem sabem que minha admiração foi tanta que precisei eternizar o momento deles, e que será o de muitos outros. Disso se trata a grandeza de um país. Proporcionar a seus filhos a prerrogativa de poderem dar o rumo que quiserem a suas vidas, sem julgamentos morais e sectários.

A Marcha foi muito justa ao se dirigir ao Supremo Tribunal e, num gesto simbólico, abraçar nossa Suprema Corte com o calor do afeto e da gratidão de muitos que tiveram a sua dignidade resgatada. Eu fui lá, abracei o STF e fotografei a marcha para todos os amigos do Brasil verem. Para que mesmo aquele cidadão homossexual que viva no mais longínquo interior possa saber que seu país está mudando, a ferro e fogo, mas mudando… E estendendo a mão para incluí-lo na sociedade, não mais como um proscrito, mas como sujeito. Pelo menos, ainda, pela acolhida da justiça – que tardou mas não falhou.

Categorias:Uncategorized